Caros gestores municipais,

Os artigos de 61 a 67 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996, trazem explicitamente a importância de os profissionais da área da Educação terem uma formação que os habilite a exercer o trabalho adequadamente, a fim de promover um ensino de qualidade. Exige-se, desde então, o diploma de nível superior dos professores. Isso já foi um grande avanço em relação ao que vinha acontecendo no país, quando grande parte dos professores não tinha nem Ensino Médio completo. Porém, somente a exigência da graduação não foi suficiente para o aprimoramento constante da prática docente nem para a melhoria da qualidade da Educação brasileira, conforme demonstram, ano após ano, os indicadores educacionais medidos pelas avaliações externas. Muitas ações pontuais e isoladas foram criadas e colocadas em prática por diversas redes públicas como pretensa solução. No entanto, quase nenhuma delas previa pontos essenciais, sem os quais nenhum passo seria efetivo: a participação dos docentes no processo de discussão das estratégias de formação e a aproximação deles com todos os outros atores do cenário da Educação, inclusive professores e profissionais mais experientes, capazes de orientá-los em seu percurso profissional.

O Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (Icep) acredita que transformações profundas na Educação só são possíveis quando quatro fatores aparecem combinados: formação continuada dos educadores articulada ao contexto de trabalho, troca constante entre os profissionais das escolas e das redes, condução dessa formação por uma equipe pedagógica competente e a construção de políticas públicas que favoreçam e legitimem a participação de todos.

Nos últimos anos, o Icep colocou a formação de professores na pauta do dia de diversos municípios, mobilizando não somente os profissionais da área mas também a comunidade, que passou a discutir temas antes restritos às secretarias de Educação e às escolas.

O Icep teve sua origem em 1997. Sua primeira ação foi a formação de professores numa escola estadual de Caeté-Açu, distrito rural do município de Palmeiras, no interior da Bahia. Os resultados positivos dessa ação contínua fizeram com que a atuação se expandisse para outros municípios da Chapada Diamantina, visando também, numa fase subsequente, a formação de coordenadores pedagógicos, de diretores escolares e da equipe técnica das secretarias de Educação. O trabalho do Icep sempre foi pautado pelo envolvimento direto dos educadores nas decisões sobre o processo formativo, nas discussões coletivas sobre os problemas da sala de aula e as possíveis soluções e na mobilização da comunidade com as causas educacionais.

Os resultados dessas iniciativas apareceram. O Icep e as redes municipais atendidas por ele logo perceberam que seria possível otimizar os esforços para, juntos, promover saltos de qualidade na Educação de toda uma região.

Com a união de municípios – a princípio informal, depois de forma estruturada –, o Icep estava antecipando uma forma de articulação que mais tarde entraria de vez nas discussões de políticas públicas de Educação: a junção de diversos entes federativos e entidades da sociedade civil para a resolução de problemas comuns. Formou-se, então, um território colaborativo.

Existem diversos tipos de articulação que têm características e finalidades semelhantes – como os Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs), os consórcios públicos ou ainda as redes colaborativas (a denominação tem variado no tempo e no espaço, já que ainda não há – como se verificará adiante – uma legislação única que as regule).

Essas variadas maneiras de otimizar esforços e recursos financeiros são vistas como uma das soluções para parte dos inúmeros impasses da Educação brasileira – entre eles o da formação continuada de professores e gestores, foco do trabalho do Icep.

Este guia se propõe a contar um pouco sobre a experiência do Icep na promoção da mobilização social e na articulação de diversas entidades. O objetivo é subsidiar gestores públicos e líderes comunitários no processo de implantação de políticas de formação continuada dentro da rede municipal ou em um território. Os casos aqui citados têm como base a experiência de secretários municipais de Educação da região da Chapada Diamantina, no interior da Bahia, que trabalharam com essa perspectiva.

Para que este guia se concretizasse, convidamos os educadores que foram secretários de Educação nos municípios do Território Chapada no ano de 2012 a elaborar textos com as principais estratégias e ações empreendidas para garantir a formação continuada em suas redes. Eles também participaram de grupos de discussão, realizados em dezembro daquele ano, com o intuito de aprofundar os temas que seriam tratados em cada um dos capítulos deste guia e construir coletivamente a estrutura desta publicação. O Icep deseja que esses conhecimentos sirvam de referência para prefeitos e secretários que almejam trilhar caminhos semelhantes e trabalhar juntos para alcançar melhores resultados nas respectivas redes.

Um processo de transformação não acontece com decreto nem com decisões unilaterais: qualquer modificação na estrutura de uma rede de ensino precisa ser feita com a participação de um número significativo de indivíduos, sempre buscando agregar vários perfis de pessoas interessadas no tema para que sejam estabelecidas estratégias e políticas sustentáveis. É para esses gestores engajados e comprometidos com a Educação, portanto, que se dirige esse esforço de compartilhamento.

Os documentos elaborados pelos secretários de Educação e suas equipes em 2012 e que embasam esta publicação foram os seguintes:

| A gestão da formação continuada perante os desafios da rede municipal de ensino, por Adriana Gonçalves da Silva, Ana Lúcia Magalhães Araújo da Silva, Sirlei Aparecida de Almeida Ribeiro.

| O resultado do Ideb: mecanismo instigador das políticas públicas em prol do direito de aprender, por Ileni Caraúba.

| Gestão municipal de educação e a formação continuada em serviço, por Liz Lima.

| A formação continuada de professores na Chapada Diamantina: caminhos trilhados para a implementação do arranjo de desenvolvimento da Educação nos municípios, por Claudison Souza dos Santos.

| Avaliações externas e internas: por um diálogo necessário, por Reinaldo Vieira dos Santos e Valéria Souza Bagues.

| Formar leitores e escritores na escola: desafios para a gestão da Educação municipal, por Simone Neves Pinto.

| Formação continuada e os caminhos trilhados na rede municipal de ensino de América Dourada, por Ziziane Oliveira de Macêdo.

Sobre o Icep O Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (Icep) é uma organização da sociedade civil de interesse público (Oscip) que tem como missão contribuir para a melhoria da aprendizagem dos alunos da Educação Infantil e do Ensino Fundamental com base na formação continuada e na mobilização política, em territórios colaborativos; na disseminação de conhecimentos; e na participação no debate político da Educação.

Entre as premissas que sustentam essa missão estão:

| O desenvolvimento sustentável de uma região só é possível com Educação básica de qualidade.

| Os educadores são capazes de transformar a realidade quando têm assegurado o acesso à formação continuada de qualidade, articulada ao contexto de trabalho.

O Icep atua dentro do conceito de território colaborativo, que envolve os profissionais da Educação e a sociedade em geral na busca de transformações no sistema educacional de uma região. O instituto atua desde 1997 nos municípios da Chapada Diamantina e, mais recentemente, nas regiões do Semiárido e do sul do estado da Bahia, em Pernambuco e em Alagoas, com base nas seguintes linhas de ação:

| Formação continuada de educadores.

| Mobilização política.

| Produção de conhecimento.

O trabalho no Território Chapada, inspirador deste documento, combina a formação continuada de professores e gestores escolares com a mobilização política para promover um ensino de qualidade para os estudantes das redes envolvidas, visando garantir a alfabetização plena para que eles possam ser leitores e produtores de texto já nos primeiros anos do Ensino Fundamental.

Em todos esses anos de formação, o Icep se orgulha dos resultados obtidos. Entre os principais estão:

| Redução expressiva dos índices de reprovação e abandono.

| Aumento do número de crianças plenamente alfabetizadas aos 8 anos.

| Criação de espaços de acompanhamento, análise e reflexão da prática pedagógica nas redes municipais parceiras.

| Identificação, pelos pais de alunos, dos avanços nas práticas dos professores e dos resultados da aprendizagem dos estudantes.

| Comprometimento da gestão pública com o avanço dos resultados da aprendizagem dos estudantes e com a articulação dentro de cada município e entre municípios.

| Superação da meta do Ideb projetada para 2011 por 90% dos municípios parceiros.

O Icep coloca-se como um parceiro técnico externo, aquele que ajuda a ampliar a visão sobre as questões locais. Ele atua na formação de formadores, buscando dar autonomia ao município nas formações continuadas posteriores aos encontros realizados pelos formadores e disponibilizando instrumentos e referências na busca de soluções para os desafios identificados.

A parceria com o Icep pauta-se pela construção de políticas juntamente com os profissionais da rede e com base na realidade e nos problemas locais. É bom lembrar que há grande oferta no mercado de modelos prontos, sem adequação às especificidades das redes de ensino nem engajamento efetivo dos profissionais que nelas trabalham. A experiência tem mostrado que iniciativas nesses moldes não geram resultados sustentáveis.

Como mencionado anteriormente, o Icep centra esforços na formação de professores, coordenadores pedagógicos, gestores escolares e equipe técnica da Secretaria de Educação, de modo a engajá-los no processo de reconstrução do próprio papel, valorizando a experiência pedagógica e o conhecimento que todos têm da realidade local.

O Icep e os arranjos territoriais

Até agosto de 2016, o Icep foi responsável pela formação de sete territórios colaborativos no Nordeste brasileiro voltados para a resolução dos problemas da Educação.